POESIA EM SALA DE AULA
Os poetas e o fazer poético
Introdução
Professor, este trabalho aborda um conteúdo pouco ensinado atualmente - a poesia. O assunto é amplo e evidentemente não será esgotado aqui. Mas, antes de começar, gostaríamos de sugerir uma reflexão sobre por que ensinar poesia na escola vale a pena:
- a poesia desperta a sensibilidade para a manifestação do poético no mundo, nas artes e nas palavras;
- o convívio com a poesia favorece o prazer da leitura do texto poético e sensibiliza para a produção dos próprios poemas;
- o exercício poético ajuda no desenvolvimento de uma percepção mais rica da realidade, aumenta a familiaridade com a linguagem mais elaborada da literatura e enriquece a sensibilidade.
O poeta José Paulo Paes diz em seu livro É isso ali: “A poesia não é mais do que uma brincadeira com as palavras. Nessa brincadeira, cada palavra pode e deve significar mais de uma coisa ao mesmo tempo: isso aí é também isso ali. Toda poesia tem que ter uma surpresa. Se não tiver, não é poesia: é papo furado.”
Objetivos
O aluno deverá ser capaz de escutar, ler, compreender, interpretar, declamar e produzir poemas. Também deve reconhecer e fazer uso de recursos da linguagem poética, quanto à sonoridade.
Conteúdos
- Revisão dos conceitos de poesia e poema, rima, verso e estrofe.
- Recursos da linguagem poética, quanto à sonoridade: rima e aliteração.
Ano
8° e 9° anos 4ª Fase EJA
Tempo estimado
10 aulas de 50 minutos
Materiais necessários
- Fotos e biografias de alguns autores, cujos poemas serão estudados em classe.
- Computadores com acesso à internet, livros de poesia.
Desenvolvimento das atividades
Organização da sala
Para a discussão dos temas, divida a turma em pequenos grupos, em duplas e, às vezes, em trios. Em outros momentos, abra uma roda, para que todos participem.
Ambiente favorável
Para criar um ambiente favorável ao estudo, leve para a classe imagens e breves biografias dos poetas que serão lidos em sala de aula. Os alunos devem ser solicitados para também pesquisarem imagens e biografias. Organize um painel num canto da sala com esse material e dê um título a ele, ou faça um concurso entre os alunos para a escolha do nome da área. À medida que o trabalho vai avançando, ali podem ser fixados poemas de autores escolhidos pelos alunos ou poemas produzidos por eles
Mão na massa
Comece esta seqüência explicando para a classe que eles vão conhecer como alguns poetas explicam poeticamente o que é fazer poesia, e assim, ampliar o estudo da linguagem poética.
Para introduzir o assunto e conhecer o que pensam os alunos sobre o tema, pergunte a eles: O que é poesia? O que move alguém a fazer um poema? Alguém da turma já escreveu um poema? Em que um texto científico é diferente de um poema?
Poesia e Poema querem dizer a mesma coisa?
No ensino da poesia, é muito comum haver confusão entre o que é poesia e o que é poema, como se fossem vocábulos sinônimos. Não são.
Dê um tempo para a classe discutir as questões em pequenos grupos.
Poesia é um termo que vem do grego. No sentido original, poiesis é “a atividade de produção artística”, “a atividade de criar ou de fazer”. De acordo com essa definição, haverá poesia sempre que, criando ou fazendo coisas, somos dominados pelo sentimento do belo, sempre que nos comovermos com lugares, pessoas e objetos. A poesia, portanto, pode estar nos lugares, nos objetos e nas pessoas. Assim, não só os poemas, mas uma paisagem, uma pintura, uma foto, uma dança, um gesto, um conto, por exemplo, podem estar carregados de poesia. Poema é uma palavra que vem do latim poema, que significava 'poema, composição em verso; companhia de atores, comédia, peça teatral', e do gr. poíéma 'o que se faz, obra, manual; criação do espírito, invenção'. Poema é poesia que se organiza com palavras.
Roda de conversa
Depois, abra uma roda de conversa e solicite que contem o que pensaram. Essa conversa dará a você, professor, uma idéia do que seus alunos já sabem ou pensam sobre poesia. Na roda de conversa, eles vão expor o conhecimento prévio que têm do tema.
Prepare-se para ler
Em seguida, diga aos alunos que você vai ler para eles três famosos poemas, dos não menos famosos poetas: Cecília Meireles, Carlos Drummond de Andrade e Fernando Pessoa. Os poemas são semelhantes no tema: os três falam do fazer poético. Não leia todos os poemas de uma vez. Dê uma atenção especial a cada um. Estude previamente a leitura dos textos. Prepare-se para ler. Leia os poemas para a classe com bastante expressividade.
Primeira Leitura
Antes de começar a leitura, pergunte para a classe se eles sabem queal é o tema do poema "Motivo”, de Cecília Meireles.
Motivo
Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.
Cecília Meireles
Para compreender melhor: canção e poesia
Peça aos alunos para observarem que Cecília Meireles chama seu poema de “canção”.
Existe uma explicação histórica para isso. Forneça à classe o trecho a seguir:
“Remonte-se à Antigüidade greco-latina ou à Idade Média e evidente será a interdependência entre música e literatura. Na época medieval, por exemplo, os trovadores compunham seus textos poéticos - as cantigas - para serem cantados e acompanhados de instrumentos como a lira. Mas com o advento de novas práticas formais, os textos literários separaram-se da melodia, resultando no estabelecimento de dois gêneros distintos: o poema, gênero literário, e a canção, gênero lítero-musical.”
Fonte: www.ufes.br/~mlb/multiteorias/pdf/FernandaScopeFalcaoOPemaEACancao.pdf
Conversa com o texto
Forneça questões que vão ajudar os alunos a compreender melhor o texto. Peça que, em duplas, eles respondam as questões no caderno. Eis algumas:
1. Explique por que o poema se chama “Motivo”.
2. Em que sentido a autora diz “Eu canto”?
4. Qual é o motivo que tudo justifica na vida do “eu-lírico” do poema? Justifique sua resposta, citando versos do poema.
5. Tomando como base a questão anterior, o “eu-lírico” de um poema pode ser outro, em relação ao escritor do poema? Por exemplo, o “eu-lírico” pode ser uma criança e o autor ser um adulto?
6. Com a ajuda do professor(a), pesquise uma letra de canção do compositor Chico Buarque, em que o “eu-lírico” é uma mulher.
Conversa sobre o texto
Reúna os alunos em círculo para conversar sobre o texto. Depois de terem discutido as questões em dupla, os alunos já têm o que falar sobre ele. Abra um espaço de discussão sobre o que foi entendido. Aqui, não existem respostas certas. O mais importante é a oportunidade para todos expressarem seus pontos de vista - o que entenderam, pensaram e sentiram, a partir da leitura e estudo do poema. Coloque as questões de compreensão em debate.
Segunda Leitura
Em outra aula, prepare-se para ler o poema “Autopsicografia”, do português Fernando Pessoa. Dê informações sobre a vida e obra desse importante poeta.
Autopsicografia
O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.
Fernando Pessoa
Vocabulário
Explique que, em língua portuguesa de Portugal, calhas de roda são trilhos e comboio de corda é um trem de brinquedo.
Conversa com o texto
Ajude os alunos a compreender melhor o texto. Peça que, em duplas, respondam no caderno:
1. O que é “autopsicografia”? Observe que na formação dessa palavra entraram: auto, psico e grafia. Você conhece outras palavras com esses radicais gregos?
2. Explique o que você compreende dos quatro primeiros versos:
"O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente"
3. Analise os versos seguintes:
"E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm"
a) A quem se referem as formas verbais no plural: lêem, sentem e têm?
b) O que você compreende por “a dor lida”?
c) A quem se referem as formas verbais no singular: escreve e teve?
d) Que palavra foi omitida neste verso: Não as duas que ele teve?
e) E nesse verso, que palavra foi omitida: Mas só a que eles não têm.?
4. Como você explica os quatro versos que acabou de analisar?
5. Nos versos a seguir, o poeta sintetiza o que disse nos versos anteriores. Vamos analisá-los:
"E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração"
a) O que gira nas calhas de roda (trilhos de trem)?
b) Que nome o poeta dá para a palavra “coração”?
c) O que significa na língua portuguesa de Portugal a expressão “comboio de corda”?
d) Com que finalidade o coração gira nas calhas de roda?
Conversa sobre o texto
Reúna os alunos em círculo para conversar sobre o foi lido. Abra um espaço de discussão sobre o entendimento do texto. Crie um clima favorável para que todos expressem seus pontos de vista - o que entenderam, pensaram e sentiram, a partir da leitura e estudo do poema.
Terceira leitura
Escolha um bom momento para ler Procura da Poesia, de Carlos Drummond de Andrade. É um poema lindíssimo e longo que vai exigir tempo. Uma sugestão é que você o deixe como síntese de tudo que for estudado nesta unidade.
Procura da Poesia
Não faças versos sobre acontecimentos.
Não há criação nem morte perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático,
Não aquece nem ilumina.
As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.
Não faças poesia com o corpo,
esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica.
Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de dor no escuro
são indiferentes.
Nem me reveles teus sentimentos,
que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem.
O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.
Não cantes tua cidade, deixa-a em paz.
O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas.
Não é música ouvida de passagem: rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma.
O canto não é a natureza
nem os homens em sociedade.
Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam.
A poesia (não tires poesia das coisas)
elide sujeito e objeto.
Não dramatizes, não invoques,
não indagues. Não percas tempo em mentir.
Não te aborreças.
Teu iate de marfim, teu sapato de diamante,
vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família
desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável.
Não recomponhas
tua sepultada e merencória infância.
Não osciles entre o espelho e a
memória em dissipação.
Que se dissipou, não era poesia.
Que se partiu, cristal não era.
Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência, se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consuma
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço.
Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?
Repara: ermas de melodia e conceito,
elas se refugiaram na noite, as palavras.
Ainda úmidas e impregnadas de sono,
rolam num rio difícil e se transformam em desprezo.
Fonte: http://www.culturapara.art.br/opoema/carlosdrummond/carlosdrummond.htm
Conversa sobre o texto
Proponha que os alunos façam as atividades abaixo em duplas:
1. Em que versos está expressa a seguinte ideia: “Parece nulo o poder do poeta sobre as palavras. Elas existem autônomas em estado latente. Mas não basta apanhá-las e justapô-las. Não se faz poesia assim. No entanto, se as palavras rodopiam na frente do poeta, elas também não podem prescindir dele, pois é a chave do poeta que abrirá as portas para que elas saiam da latência em que se encontram.”? (O FAZER POÉTICO EM DRUMMOND, Fábio Della Paschoa Rodrigues) - http://www.unicamp.br/iel/site/alunos/publicacoes/textos/f00004.htm
2. De que estrofe você mais gostou? Leia-a para os colegas e explique por que você a escolheu.
Atividades de revisão
Proponha as seguintes atividades para serem feitas em trio:
1. Quantos versos e quantas estrofes têm cada poema lido?
2. Leia em voz alta um dos poemas para os colegas e peça para eles perceberem as rimas. Depois, troquem a posição, até as rimas dos três poemas terem sido percebidas. Discutam se todos os poemas lidos têm rima.
Peça que os alunos comparem como Cecília Meireles, Pessoa e Drummond vêem o fazer poético. Há pontos semelhantes? Quais?
Avaliação
Este é o momento de saber se eles, de fato, aprenderam aquilo que você queria que aprendessem. Se não aconteceu, você deve buscar as causas e reorientar a prática.
Atividades de avaliação
Produção de texto - Por meio dos textos que os alunos irão produzir, você avaliará o que compreenderam do que foi estudado e se os seus objetivos de aprendizagem foram atingidos. Ensine que nenhum texto nasce pronto. Para ficar bom, é preciso escrevê-lo e reescrevê-lo muitas vezes, como fazem os bons escritores.
Diga à classe que cada um planeje o que vai escrever, faça rascunho, revise e finalmente passe a limpo seu poema. Reúna as produções dos alunos e exponha-as num mural ou organize uma antologia:
1. O fazer poético - Solicite que escrevam para o 7° ano, um texto expositivo em que explique o que é o fazer poético. Esse texto deve ser em prosa. Depois de pronto, marque um encontro com os colegas do 7° ano. Avise que os textos que escreveram serão avaliados por esses colegas. O leitor é que dirá se entendeu a explicação dada no texto lido por ele. Será considerado bom o texto que conseguiu dar uma explicação satisfatória para o leitor de outra série.
2. Imite o poeta - Peça que produzam um poema em que falem o que é o fazer poético. Esse texto deve ser em versos, distribuídos em estrofes, com rima. Enfatize que poesia é invenção.